segunda-feira, 30 de setembro de 2013

M, O VAMPIRO DE DUSSELDORF (1931), de FRITZ LANG - 28.09.2013

A abertura já é espetacular, e a primeira vez em que vi o filme, anos atrás, já tive a impressão que um filme alemão
de 1931 tem uma qualidade técnica que o cinema brasileiro nunca havia atingido - talvez hoje tenha alcançado a técnica, finalmente. 
As crianças, em roda, cantam uma cantiga que fala de um homem com uma machadinha que decapita crianças. Uma música assustadora. Uma mulher pede que as crianças parem com a cantoria pois há um assassino de crianças à solta. A câmera sai das crianças e filma as varandas internas do prédio - a ação logo mudaria para lá. 
Elsie - uma menina sai da escola batendo sua bola. Alguém assovia uma melodia (da ópera Peer Gynt), e esse alguém se aproxima da menina, lhe oferece um balão, comprado de um balonista cego - que ouve a melodia assoviada. Sabemos que Elsie será a próxima vítima.
Voltamos para o condomínio, onde a mãe de Elsie prepara o almoço. É meio-dia a menina não chega da escola. A mãe começa a ficar preocupada, os minutos vão passando. Ao mesmo tempo em que vemos o relógio-cuco, a cadeira vazia, o prato e os talheres ainda sem ter sido servida a comida nos vai dando a certeza da morte de Elsie - numa ótima montagem, confirmada afinal com a sua bola rolando para fora dos arbustos e o seu balão flutuando preso nos fios do poste de luz. Finalmente, às 13h15 a mãe berra por Elsie, percebendo que sua filha é a mais nova vítima do assassino.

Logo se verá que toda a cidade (e todos seus segmentos) está perdida em razão dos crimes. A polícia está com toda a sua força nas ruas, já estafada de há tanto tempo procurar um assassino invisível - há inclusive estudos para determinar o perfil psicológico do "vampiro de dusseldorf" - que de vampiro não tem nada, é só o título brasileiro do filme.
A população também está desnorteada. Um clima de caça às bruxas se instala. A gana de linchamento para qualquer um que converse com uma criança está presente. As denúncias contra os vizinhos ou qualquer suspeito de qualquer coisa, também.

Igualmente os ladrões da cidade estão apavorados. Com a polícia atuando fortemente, os larápios comuns não têm trégua, e correm o risco de serem presos a qualquer hora, pois qualquer um suspeito ou sem documentos pode ser detido. Ademais, concluem que um matador de criancinhas não respeita a "ética" da bandidagem.
Os bandidos então resolvem que também caçarão o infanticida, e para isso contatam o "sindicato dos mendigos" - na Alemanha até os mendigos são organizados, presume-se - que ficarão alerta nas ruas. 

Com base no perfil psicológico, a polícia se aproxima do homicida, chega a ir à sua casa, recolhe indícios importantes, mas não consegue ter certeza sobre a culpa do suspeito e nem capturá-lo pois este não está em casa.
De outra banda, os mendigos estão atentos, e quando Hans Beckert (Peter Lorre, espetacular) assovia a sua música, o vendedor de balões cego o reconhece, e chama um seu amigo, e passam a segui-lo, até que o encurralam em um prédio de escritórios, e armam uma estratégia para invadir o prédio e capturá-lo.
Para evitar que Lorre escape, o mendigo escreve com giz um grande M em suas mãos e o passa no sobretudo do criminoso, marcando-o de forma indelével, permitindo que todos possam reconhecê-lo - ótima sacada, marcando o M de "mörder" - assassino - na roupa do bandido.
Finalmente capturado pelos ladrões - e não pela polícia - Beckert é levado ao porão de um prédio abandonado, onde um julgamento será feito, inclusive se assegurando um defensor para o assassino.
A acusação é veemente, e a pena de morte a pedida. O defensor diz que o caso é de insanidade, e que Beckert deve ser entregue à Justiça. 
Há o discurso do assassino, dizendo que não pode evitar ser o que é e fazer o quê fez, e que a perversão está com ele o tempo todo, e o segue, assim como os fantasmas de quem ele mata e dos pais destes. E que somente ao cometer o crime, aquelas vozes ou fantasmas se calam, e ele tem calma. Cito:
Hans Beckert: I can't help what I do! I can't help it, I can't...
Criminal: The old story! We never can help it in court!
Hans Beckert: What do you know about it? Who are you anyway? Who are you? Criminals? Are you proud of yourselves? Proud of breaking safes or cheating at cards? Things you could just as well keep your fingers off. You wouldn't need to do all that if you'd learn a proper trade or if you'd work. If you weren't a bunch of lazy bastards. But I... I can't help myself! I have no control over this, this evil thing inside of me, the fire, the voices, the torment!
Schraenker: Do you mean to say that you have to murder?
Hans Beckert: It's there all the time, driving me out to wander the streets, following me, silently, but I can feel it there. It's me, pursuing myself! I want to escape, to escape from myself! But it's impossible. I can't escape, I have to obey it. I have to run, run... endless streets. I want to escape, to get away! And I'm pursued by ghosts. Ghosts of mothers and of those children... they never leave me. They are always there... always, always, always!, except when I do it, when I... Then I can't remember anything. And afterwards I see those posters and read what I've done, and read, and read... did I do that? But I can't remember anything about it! But who will believe me? Who knows what it's like to be me? How I'm forced to act... how I must, must... don't want to, must! Don't want to, but must! And then a voice screams! I can't bear to hear it! I can't go on! I can't... I can't...

Quando a turba de ladrões se prepara para o linchamento, a polícia chega - pois um dos ladrões foi esquecido dentro do prédio de escritórios em que perseguiram Beckert, e para não se ver enquadrado por algo que o policial o acusaria, conta que aprisionaram o assassino de crianças, e para onde o levaram. Com o policial fora do quadro, todos os bandidos levantam suas mãos, e uma mão no ombro de Beckert anuncia: "... em nome da lei...". 
Corta logo para o Tribunal, os juízes tomam assento na bancada, mas nada dizem.
A mãe de Elsie, então faz um discurso dizendo que o julgamento não trará as crianças de volta, e que é preciso que os pais cuidem delas.

Aparentemente, o filme fala dos crimes em si, mas também da Alemanha do entreguerras, que já vê o embrião do nazismo em evolução. As delações, o clima de desconfiança, o apodrecimento dos padrões morais e sociais. Mas isso é controverso.

Nota IMDB - 8,5. Vale isso, talvez ainda mais. Filmaço. Merece um 9.

domingo, 29 de setembro de 2013

VIAGEM À LUA (1902), de GEORGES MÉLIES - 28.09.2013

Esse filme de curtametragem - segundo os historiadores do cinema, o primeira longa só seria feito em 1906, um filme australiano chamado "The Story of the Kelly Gang" - com
quinze minutos de duração, é muito bacana.
Num congresso de sábios ou algo assim (astrônomos, provavelmente), um deles anuncia, explicando no quadro-negro que pretende fazer uma viagem à lua. Há uma grande algazarra, excitação, embora a encenação seja meio teatral - as câmeras são fixas, e portanto como se num palco teatral, as personagens são obrigadas a interagir.
Logo depois, em outra cena, a câmera capta os homens construindo a "cápsula espacial", em formato de um projétil de revólver, bem como o canhão lançador - também há uma cena em que parece que este canhão está sendo fundido, em um enorme buraco rodeado por fábricas.
Então, os exploradores embarcam na aeronave, esta é posta dentro do canhão lançador e os homens são disparados em direção à Lua.
Na cena seguinte, uma das mais clássicas seqüências do cinema: - a nave, em forma de projétil, disparada pelo canhão - vai em direção à lua, há aproximação com zoom - provavelmente com a aproximação da cena filmada -  e "aterrisa" no rosto da Lua, personalizada, sendo que o rosto ali presente é o do próprio Mélies. 
Da lua, eles vêem o Planeta Terra; ali, enfrentam selenitas e os explodem, vão em perseguição ao lider dos alienígenas e o eliminam, quando saem fugidos para o nosso planeta. No entanto, um dos habitantes lunares consegue se agarrar à nave e vem oculto à terra.
Aqui, são recebidos como heróis, principalmente o mentor de toda a viagem - o prof. Barbenfouillis (parece que retirado do livro de Júlio Verne) - há uma parada em sua homenagem, a inauguração de uma estátua em seu louvor. Por fim, são ainda obrigados a derrotar o selenita que veio à Terra pendurado à nave.
Efeitos especiais - os telescópios dos sábios se transformam em banquetas, um guarda-chuva vira um enorme cogumelo, os selenitas são explodidos pelos golpes dos exploradores; uma história de ficção científica, a presença de alienígenas, um roteiro, uma história, a imagem indelével da nave batendo na Lua. Tudo isso deve ser sempre visto, e entendido. É uma outra linguagem fílmica, de câmeras estáticas e planos abertos, e os atores agindo teatralmente - quase um teatro-mudo-filmado. Mas é muito legal.
E está muito fácil de ser visto. Basta procurar no youtube - há agora uma restauração do filme à cores (colorizado à mão, quadro a quadro). A única coisa insuportável é a música moderna que fizeram para acompanhar o filme, parece que de músicos conhecidos como "Air Duo". Horrível.
Nota IMDB -  8,2. É difícil classificar ou avaliar algo tão especial. Pelo valor histórico e a cena clássica antes narrada, e pela importância para a história do cinema, temos algo de valor incalculável e de impossível avaliação com uma simples nota.  

domingo, 15 de setembro de 2013

FILHOS DO DESERTO (1933), de WILLIAN SEITER - 14.09.2013

Há muito que não assistia a um filme de "O Gordo e o Magro", e resolvi ver o "Filhos do Deserto".
Legalzinho, inocente, mas passável.

Laurel and Hardy são membros de uma confraria, a "Sons of the Desert", e estão numa convenção na Califórnia, quando têm de fazer um juramento - inquebrável - de participarem da convenção anual em Nova York, mas especialmente Laurel não sabe se vai poder participar, pois depende da concordância de sua esposa. 
Vemos então um humor físico, quase de esquetes, como a das campainhas nas casas da dupla - eles são vizinhos de porta - a fruta de cera que Laurel come, os tropeções em malas, baldes, etc, colocados no meio do caminho, vasos quebrados na cabeça.

Hardy, que afirmara mandar em casa, e que iria à Convenção facilmente, e sequer falaria com sua mulher. No entanto, Laurel dá com a língua nos dentes e então a mulher de Hardy o proíbe de ir à Convenção, tendo o gordo de ir passar um final de semana nas montanhas com sua mulher. 
Laurel, contudo, logo consegue a autorização da esposa, e então é hora de os dois bolarem um plano para que Hardy consiga ir à convenção. Este simula um colapso nervoso, cuja única solução - segundo conselho médico (veterinário) -  é uma viagem a Honolulu, acompanhado de Stan (mero pretexto para que ele possa ir à Convenção com seu amigo).
Tudo muito bem, os dois vão a Nova York - onde o filme perde interesse, fica maçante - mas nesse ínterim há o naufrágio do navio em que eles deveriam estar na viagem a Honolulu.
As duas mulheres ficam preocupadíssimas, talvez tenham perdido seus maridos, e vão atrás de informações. 
Laurel e Hardy voltam para casa, sem desconfiar de nada. Quando chegam à residência, as mulheres não estão em casa. Despreocupados eles esperam, até o momento em que lêem a notícia do naufrágio no jornal, e se desesperam. Como suas mulheres agora estão retornando para casa, a única saída é esconderem-se no sótão, onde pretendem deixar o tempo passar, para chegarem em casa juntamente com o bote que salvou os náufragos. 
Enquanto esperam, suas mulheres foram ao cinema e, lá, vêem anúncios da convenção dos "Sons of the Desert" em New York, e Laurel e Hardy se esbaldando.
Cientes da mentira, agora é só o tempo de esperar os maridos chegar em casa. Ainda no sótão, os protagonistas sofrem 
uma infinidade de contratempos (um raio inclusive, suas mulheres armadas) os faz sair para o telhado, descerem, serem abordados por um policial e, assim, para se livrar da prisão, confessar que moram ali ao lado e, finalmente, encarar as consortes.
Hardy mantém a mentira, embora as mulheres já estivessem cientes de tudo. Laurel logo confessa. Então vemos Laurel vestido de robe de chambre, todo confortável (pois ter falado a verdade lhe ajudou), enquanto Hardy sofre com toda a louça de sua casa lhe sendo arremessada. O magro ainda tira um sarrinho do gordo, para terminar o filme.

Nota IMDB - 7,7. Acho que é pra menos. Um 6, talvez.  Tenho que rever mais alguma coisa de "O Gordo e o Magro". Quem sabe as esquetes mais curtas sejam melhores. As gags visuais, as olhadas de Hardy para a câmera, as situações de absurdo são o que há neste filme, de roteiro simples (lembremos, estamos em 1933), mas algumas boas risadas.